quarta-feira, 5 de outubro de 2011



Conveniência ou necessidade?




10:05 - 05/10/2011
Se fôssemos repórteres de televisão e saíssemos pelas ruas de Salvador perguntando a cada pessoa que encontrássemos: “Segundo o seu parecer, qual o maior problema de nossa sociedade, hoje?”, o que ouviríamos? Muitos responderiam: O maior problema é a insegurança em que vivemos; outros diriam: a falta de assistência à saúde; o desemprego; a fome; as doenças etc. É possível que alguns iriam mais longe e responderiam: Nosso grande desafio é a falta de ética em nossa sociedade.
Mas, o que é ética? Muitos podem não saber dar as definições desse termo; têm, no entanto, comportamentos éticos, exigências éticas e, particularmente, sofrem – e muito! – com a falta de ética ao seu redor.

A palavra “ética”, de origem grega, refere-se aos costumes da sociedade. Os gregos se perguntavam: O que é bom para o povo? Acreditavam que as leis e as instituições poderiam mostrar o que é “bom”. Não demoraram muito a descobrir, porém, que esse “bom” não é sempre o mesmo para todos, em todos os lugares, e que certos valores mudam com o tempo. Mais tarde, chegaram à conclusão de que deveria haver normas de comportamento com valor permanente, que não mudariam com o tempo e lugar. Foi um grande avanço em suas reflexões.

Ética é a teoria ou a ciência do comportamento humano na sociedade. Responde a perguntas como: O que é bem? O que é mal? O que é válido? Qual deve ser o comportamento de cada pessoa nessa ou naquela situação? Um comportamento é ético quando tem por princípio a realização de todos, e não de apenas um grupo ou de uma minoria. No campo cristão, fala-se em moral, em moralidade. É o comportamento regulado pela Revelação – isto é, pela Palavra de Deus e, de modo especial, pelo Evangelho. Síntese dá ética bíblica são os 10 Mandamentos. Se todos, na sociedade, os observassem, saberíamos o que significa uma sociedade fraterna, pacífica e solidária.

Todos sentem que, de alguns anos para cá, os costumes da sociedade mudaram muito. Está havendo um novo modo de pensar, de agir e viver, fora dos princípios éticos até há pouco tempo respeitados e aceitos. É o que se chama de “crise ética”. Pior ainda é a crise da Ética, isto é, a tendência a se considerar como “natural” essa nova situação, como se não houvesse normas para reger os atos humanos, tanto particulares como públicos.

A crise atual está gerando duas atitudes predominantes, ambas criticáveis: de um lado, o apego ao que é tradicional, por ser tradicional, gerando o fundamentalismo. A outra atitude, mais difundida, é marcada pelo individualismo – tendência estimulada pela dinâmica da sociedade atual, que faz com que cada pessoa se coloque no centro das decisões. Cada um faz suas escolhas como se estivesse num supermercado – isto é, o critério fundamental passa a ser o gosto pessoal, na linha do “bom é o que eu gosto”. As decisões deixam de ser tomadas, pois, em função de valores objetivos ou universais; predomina o: “Eu acho que...”, “Eu penso que...”, “Eu prefiro...”. Desaparece a comunhão e a fraternidade; multiplicam-se “ilhas”, pois cada qual se fecha em seu mundo. Surgem pessoas inseguras e inconstantes, insatisfeitas e egocêntricas.

Por outro lado, cresce a consciência de que é preciso tomar uma posição clara diante de certos comportamentos ou atitudes – por exemplo: diante daqueles que, ocupando um cargo de responsabilidade, guiam-se em função de seus próprios interesses, são pouco transparentes no agir, envolvem-se em corrupção ou abuso de poder; ou de legisladores, que aprovam leis que terão repercussões negativas sobre a família, a vida do nascituro ou do doente terminal, a natureza etc.; de economistas, que aceitam como normal que a economia gere vantagens para poucos e sofrimento para a maioria etc.

Entende-se, pois, qual o papel da política e do político: cabe-lhes aprovar leis que regulamentem nossa convivência humana, levem em conta o bem de todos e defendam os mais desprotegidos. Se isso não acontecer, prevalecerão a violência e a injustiça – sinais evidentes do fracasso de uma sociedade, no plano ético.
Fonte: Dom Murilo S.R. Krieger, scj
Arcebispo de São Salvador da Bahia

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