domingo, 31 de janeiro de 2010

Uma comunidade de profetas

Jeremias é chamado por Deus a ser profeta das nações (1ª leitura); Jesus se apresenta como o profeta que cumpre sua missão do modo como Deus o quis (evangelho); a Igreja é uma comunidade de profetas. Mas que quer dizer ser profeta?

O profeta, um "ser-contra" por amor

O profeta é a consciência crítica do povo, uma consciência crítica não tanto em nome da razão, quanto em nome da palavra de Deus. Por isso, o profeta é um "ser-contra" (1ª leitura); desmascara as astuciosas cumplicidades com o mal, onde quer que se encontrem; denuncia com firmeza os vícios do povo, a falsidade do culto, os abusos de poder, qualquer forma de idolatria e de injustiça, qualquer tentativa de "aprisionar" a Deus. A denúncia profética é "juízo de Deus" sobre a malícia humana e ao mesmo tempo comunicação da sua santa vontade. É sempre, pois, um convite à conversão do coração, pessoal e coletiva.

A denúncia profética é obra de amor, um amor apaixonado por Deus e pelos homens. O profeta é o defensor dos oprimidos, dos fracos, dos marginalizados; está sempre do seu lado; é a sua voz; a voz de quem não tem voz nem vez; é chamado a ser responsável por Deus diante dos homens e responsável pelos homens diante de Deus.

O profeta e; o homem da esperança. A denúncia do mal não o torna amargo; ele olha para a frente com confiança. Nos momentos mais duros da história do povo eleito (deportações, exílio, sofrimentos) as palavras do profeta são palavras de consolação e confiança. Denunciada a infidelidade do povo, o profeta anuncia a fidelidade de Deus, na qual se baseia firmemente a esperança.

O profeta é o homem da "aliança". É homem que viu a Deus; não, certamente, Deus em si mesmo. Deus nos ultrapassa sempre, é sempre o Deus "escondido". O profeta vê o que Deus faz, vê o seu plano de amor, faz uma leitura divina dos acontecimentos humanos.

Cristo profeta, e mais do que profeta

Os judeus viviam aparentemente uma história profana semelhante em tudo a história dos outros povos. Mas o profeta lê a história como um diálogo dramático entre Deus e o homem, e assim a transforma em uma história "sagrada”.

O profeta sempre lê o presente com um olhar retrospectivo (aliança do Sinai), e um olhar prospectivo (nova aliança). Sempre insatisfeito com o presente, faz a história caminhar e a impele para seu pleno acabamento: a aliança, a comunhão de amor da humanidade com Deus.

Mas ao chegar o momento, essa plenitude se manifesta de modo totalmente inesperado; a aliança é Jesus de Nazaré, o Homem-Deus. União mais perfeita do homem com Deus é impossível. Não só ele fala em nome de Deus, mas é Deus que fala nele. É revelação perfeita. Nele coincidem a profecia e o objeto da profecia. Por isso, Jesus é profeta e mais do que profeta (evangelho).

A Igreja, povo de profetas

Como Corpo de Cristo, a Igreja participa do carisma profético de sua Cabeça. Tem autoridade para ler os acontecimentos na fé, em relação a tudo que já se realizou definitivamente em Jesus Cristo, e ao que ainda deve realizar-se para que o Corpo atinja sua plena estatura. Descobre nos acontecimentos o terreno privilegiado em que o Deus de Jesus Cristo não cessa de chamar o homem para o encontro com ele, em vista da construção comum do Reino sobre o fundamento da pedra angular.

A Igreja é realmente comunidade profética enquanto é comunidade de amor gratuito e universal (como Paulo mostra na 2ª leitura). Éuma novidade absoluta e inaudita. Denúncia concreta, feita com a vida e não com palavras, para uma sociedade que se constrói sobre o egoísmo, o arrivismo, a ambição, a negação prática de Deus. Mas é também uma profecia concreta daquilo que, no Intimo, todos os homens e toda comunidade humana desejam. Por isso, a esperança da comunhão não é uma ilusão. Mas, assim como o ser-contra por amor resultou em sofrimentos, perseguição e morte para Jeremias e para Cristo, essa é também a sorte da Igreja se, segundo sua vocação, for uma comunidade profética. Não há profecia sem sofrimento. [Missal Cotidiano, ©Paulus, 1995]

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